14 de nov. de 2016

19 de Julho de 1982 ... o livro, Claudia e muitas histórias


"Dado a mim, no dia 19/07/1982 por mim mesma. É o presente que recebi, por descobrir mais uma saída dos problemas da vida. Por ter entendido que tudo que quero nessa vida, depende só e unicamente de mim e de mais ninguém" Claudia 

Não conheci esta Claudia, no entanto, eu mesma já me vi chegando a esta conclusão. Os caminhos da vida dependem muito de nossas escolhas. Claro, eu bem sei também, que existem vendavais ou dias quentes, que não foram exatamente uma escolha, ao menos, não consciente.
Este livro tem quase minha idade e sempre fui apaixonada pelas histórias dos livros. Não somente aquela que o autor criou...mas a história das mãos que leram ( ou escreveram como a Claudia) , por onde o livro passou, as marcas amarelas em suas páginas são como as sardas ou rugas no rosto, contam uma história. 
Lembro que ia à biblioteca publica em meu bairro, adorava o cheiro de livros velhos e passeava pelos corredores. Estantes enormes de livros e a diversão além da leitura, era imaginar o que significam os títulos e capas, e ler as dedicatórias.
Gostaria de poder contar a história deste 19 de Julho. Nitidamente temos coisas em comum : o fato de gostar de poesia, de se auto presentear com livros, de fazer reflexões sobre a vida... 
Mas já que não conheço a história da Claudia, contarei a minha, não neste dia, mas a história com o livro.
Em minha adolescência , tomei consciência de uma de minhas principais caraterísticas: reflito o tempo todo, sobre pessoas, comportamentos, sentimentos, fatos e conhecimentos. Não é algo que possa ser controlado. E nesta época, somar minha mente ao turbilhão de hormônios e a crises familiares, deu no que deu...depressão. Como sempre digo, tudo ,ao menos, tem um lado bom e um ruim... a depressão trouxe a poesia e a busca de conhecimento com a terapia. 
Falando de poesia, chegamos a este livro. Ele e uma outra antologia poética, ficavam numa gaveta  do criado mudo de minha mãe. Lá também tinham outras coisas: anotações, cadernos de poesias, algumas lembranças em forma de objetos. Não me interessava ainda pela leitura de poesia, para mim, poesia era mais uma forma de libertação...eu o papel e o verso numa relação conturbada de emoções fortes e exageradas. 
Anos mais tarde, comecei a ler poesia e consequentemente a perceber que nem de longe eu era realmente poeta ...existe neste livro de Claudia uma poesia que me compeliu a escrever mais.... cheguei a  escrever uma peça teatral baseada nela , elas são homônimas... a vida vivida... vou ter agora que escolher um trecho para reproduzi-la, uma tarefa complicada visto que ela é uma daquelas que de alguma forma escreveram sobre mim , ou para mim...

"...O que sou eu senão ele, o Deus em sofrimento
O temor imperceptível na voz portentosa do vento
O bater invisível de um coração no descampado...
O que sou eu senão Eu Mesmo em face de mim? "


Passei pelo menos uns 12 anos sem avistar ou folhear este livro. E no final das contas, ele veio parar em minhas mãos, como herança de minha mãe. Foi um dos poucos que restou em suas pouca bagagem material, bem contrária a da espiritual que sempre me insiprou tanto e era enorme.
Lembra do caderno companheiro do livro no criado mudo ? Ele veio também para cá. Pois é... como não acredito que os fatos ocorrem por acaso, ainda repetirei a leitura das poesias e em breve a do caderno.
Infelizmente não saberei quem é a Claudia. Isso será uma pergunta unicamente ao imaginário que criará a história sobre a mulher que gostava de poesia do Vinicius. Deixo registrado meu agradecimento a ela que num dia de Julho de 1982, resolveu presentear-se com um livro maravilhoso, que participou de minha fase de curiosidade de criança, de confusão adolescente, de criação na juventude e de meu alento com o maior adeus de minha vida. 
Obrigada Claudia por fazer parte de minha história.

Para ler a poesia completa A vida vivida de Vinicius de Moraes
http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/poesia/poesias-avulsas/vida-vivida

25 de set. de 2016

Tudo misturado


Ruivas tatuadas , esguias e misteriosas. Loiros altos, másculos, mas sem exagero. Morenas fatais, com pernas longas e torneadas. Mulatas de coxas tenras , tornozelos finos e pés atraentes. Mulheres pequenas, magras e definidas. Homens suados, maduros, cheirosos.
Onde me enquadro? Em nenhum destes quadros.
Sempre fui sem perfil definido. Gordinha ou quase isso. Não tão inteligente para entrar em certos ciclos, mas,não tão sem conteúdo para não ser chamada de "nerd". 
Gosto de algumas coisas que se enquadram no atual mundo geek, mas não li o manual do mochileiro das galaxias e ainda faltam 4 filmes do Stars Wars para assistir. Entro na balada, e não atraio olhares. Danço, danço muito! Nem por isso fico rodeada de mulheres. Não sei em qual manual de conquista eu estaria classificada. Escrevo poesia, é verdade. Se todo poeta fosse igualmente amante, não teríamos tantos boêmios no século passado. Sim, a boêmia era sinal de solidão. E ao mesmo tempo, ninguém ficava sem companhia na cama. 
Taças de vinho, copos transpirando cheios de vodca. Água ardente misturada com gelo, limão e muito açúcar. Cerveja com colarinho alto, tão gelada , que me faz voltar ao vinho. Tudo misturado. E o corpo mistura tudo também, emoções, pensamentos, os desenhos de um livro, rascunho de poesia, novamente, emoções. No final é melhor deixar o riso fluir. Sentir. Viver é isso. Sentir o momento. 
Mas quem sou eu, mesmo? Não tenho tribo, não tenho definição. Também, nunca me esforcei em ser nada. Sempre gastei energia em descobrir quem sou eu. E esta será uma busca eterna. Quando me acho meditando,  numa curva de uma noite de luar, me perco, pois olho estasiada, ou chocada, um capítulo passar em minha vida, levantar uma onda de arreia e me cegar. Fico sempre em dúvida sobre quem escreve estes textos.Leio e não me reconheço. E ao mesmo tempo, poderia assinar com todos meus 5 nomes, algumas frases que deixo por aqui, ou em minhas cartas.
Me encaro no espelho e agora vou me descrever: pouco mais de um metro e cinquenta. Gosto dos meus pés, da parte inferior das pernas; na direita uma tatuagem toma boa parte como um raio escuro. Do lado esquerdo o menino vestido de camiseta vermelha, um dos meu "alter ego". Pele branca , observo de lado minhas costas, ainda são lisas, apenas uns traços perdidos mudam a palidez. Este nome que já não faz sentido, é um marco que me transformou. Logo dará um lugar a um dragão, um tribal, uma mulher nua, uma bruxa...Olhos escuros, profundos, um pouco marcados pelo cansaço, por fatos do passado. Eles me fitam... e profundamente são os que mais falam o que realmente é minha alma. Meus lábios me atraem, não preciso de batom, não preciso de mais cor. Cabelos escuros, já foram mais. Já foram avermelhados. E agora, misturam-se a um branco prateado. O colo e os seios mais fartos do que outrora. Decididamente, sou várias mulheres. A meia luz de um quarto, vários homens, mulheres, meninas, dominadores e passivos... tudo misturado. Olho no espelho... não sou nada. Alma sensível , corpo mais ainda. Se posso ver um pôr do sol com um abraço, também desço ao inferno com uma palavra.
Volto. Olho o copo vazio. Olho a tela que escrevo. Olho minhas mãos. 
E não sei como finalizar este texto. Até breve, volto logo... Adeus! ...Eu te amo... até amanhã... sinto medo. Olho o espelho...